sentimento luto

O sentimento de luto após o diagnóstico de autismo.

…eu sentia um vazio…um sentimento de nada, eu amava aquela criança que estava a minha frente, mas naquele momento…

Diariamente inúmeras pessoas passam por processos trágicos, seja a morte dos pais, filhos, avós, amigos queridos, diagnósticos de doenças em fase terminal, perca de animais de estimação, a perca de um emprego que amava, a separação em um relacionamento, assaltos, falência… estamos sujeitos a uma lista enorme, quando perdemos alguém ou algo que não pode ser recuperado o sofrimento parece não ter fim.

Todas essas situações têm um poder devastador na vida de quem é acometido por elas, superar nem sempre é um processo fácil e recomendo que se alguém tiver a oportunidade de ser o suporte de quem passa por esses momentos, deve estar lá.

Mas e quando a perca é simbólica, quando o que perdemos é uma ideologia, uma utopia, uma forma de pensar ou uma expectativa?

Após o episódio que digo ser o “diagnóstico final” do Emanuel, naquele 16/03/2016 (post #1), passei pelo processo chamado de “luto do filho vivo”, é um nome forte e que machuca, mas um processo que muitas famílias passam, seja pelo diagnóstico do autismo ou por outras deficiências.

Se você “der um Google” vai ser apresentado a inúmeros relatos de famílias que já passaram por esse processo.

É difícil explicar o que significa, mas naqueles dias que se passaram após a frase da Neuropediatra “Sim, é autismo, Boa Sorte!” eu sentia um vazio, um buraco havia me engolido, um sentimento de nada, eu amava aquela criança que estava a minha frente, mas naquele momento era como se não fosse meu filho.

Meu menino sonhado, planejado, saudável e perfeito não estava mais ali, eu não o reconhecia e o que tinha se estabelecido era uma culpa, uma enorme culpa que ardia no peito (assunto para outro post).

Foram muitos meses nesse luto, passaram muitas lágrimas que corriam escondidas, apenas uma colega do trabalho presenciou meu momento de luto e guardo suas palavras com imenso carinho, pois ela foi àquela pessoa que citei no inicio deste post.

Defino o luto do filho vivo como a perca (temporária) dos nossos sonhos de felicidade por aquele ser tão indefeso, eu tinha muitos sonhos para ele, mas um papel eliminou todos, simplesmente não sabia o que fazer. Por muito tempo a palavra futuro significou medo. Eu sentia pânico ao tentar pensar no futuro do Emanuel, na época com menos de 4 anos de idade.

Eu não admitia chorar na frente de ninguém, nem meu esposo, nem meus pais e amigos. Poucas vezes, ao comentar sobre o diagnóstico, eu me emocionava e já me retirava, pois doía demais. Foi um processo difícil, queria ser e parecer forte com tudo aquilo que estava acontecendo. A angustia havia começado em 2015 com as suspeitas, mas depois da certeza em 2016, ficou insuportável.

Depois percebi que esse processo se manifesta principalmente pelo nosso desconhecimento do que significa aquele diagnóstico, eu não sabia o que era o Autismo, não sabia como impactaria minha vida, minha família e principalmente a vida do meu filho.

Imaginar uma deficiência em nosso filho após uma gestação saudável e sem nenhuma intercorrência é algo impactante demais, ninguém se prepara após o parto para “o pior ainda está por vir”, mas ele vem e isso é mais comum do que a gente consegue imaginar, basta visitar uma clinica de reabilitação neurológica para constatar a realidade de muitas famílias que lutam diariamente para dar melhores condições para aqueles que são sua razão de viver.

A superação:

A primeira forma de superar esse processo de luto é o conhecimento, entender o que realmente está acontecendo, mais do que saber em que grau/nível nosso filho está no Espectro Autista é descobrir os principais comprometimentos e comportamentos dentro das características do autismo, para que se possa iniciar o processo de intervenções o quanto antes.

Outros fatores que ajudam nessa superação são:

– encontrar um profissional que lhe passe segurança e confiança é fundamental, nem sempre é na primeira consulta que encontramos esse ser iluminado, então não desista;

– não se isolar, existem muitas pessoas passando pelo mesmo momento que você e muitas outras que já o superaram, busque ajuda e apoio;

– estar disposto para muito esforço físico e mental, para sair do luto é preciso muita luta interna principalmente;

– viver um dia de cada vez, se for necessário, busque ajuda terapêutica para a família também, se o seu hoje não foi tão bom, não se culpe, tente de novo amanhã;

– não comparar seu filho (a) com outros autistas, cada autista é único e deve ser respeitado em sua individualidade.

São pequenas sugestões de quem praticou e têm dado certo!

Passar por esse momento foi difícil e lembrar-se dele é delicado até hoje, mas foi fundamental para o sucesso nas intervenções, após passar pela perca do filho ideal, aprendi que eu não podia colocar limites na capacidade do Emanuel.

Assim como nós temos muitos desafios ao longo de nossa tipicidade, temos nossas dificuldades em muitas áreas da vida, ele também as tem, mas a partir do momento que eu não digo que ele não é capaz de algo, que eu o incentivo a não desistir, ele tem nos mostrado que com paciência, dedicação, treino e esforço de todos, podemos voltar a sonhar.

Se sua criança recebeu esse diagnóstico recentemente e você está passando por esse momento tão delicado, deixe seu comentário aqui, desabafar e conhecer outras histórias nos fortalece e ajuda a continuar essa jornada!

vitoria autismo

Posted in Histórias, Sobre Autismo and tagged , , , , , .

9 Comments

  1. Pingback: Ser mãe de autista, vivendo alegrias! - Manjedoura Azul

  2. Pingback: Mãe de Autista, vivendo o espectro! - Manjedoura Azul

  3. Pingback: Expectativas e autismo: como pensar no futuro? - Manjedoura Azul

  4. Que ótimo este blog! Acho triste quando se trata uma síndrome como luto. Só quem viveu um luto sabe o significado do termo “Luto não tem luta” e o autismo é somente uma condição da forma de se viver ou conviver , que impõe aos envolvidos do portador da síndrome novas atitudes e habilidades específicas de rotina. Amo os autistas!!!

    • Obrigado Rosangela por sua contribuição. Talvez seja uma forma imatura e precipitada de acolher o diagnóstico. Sua colocação foi muito importante para repensar sobre esse sentimento.

      • Rosangela,não sei se você tem um filho autista.
        Mas quando meu esposo descobriu o diagnóstico do nosso filho .
        Ele viveu esse momento,ou melhor continua vivendo .
        Ele idealizou um Filho,ele sonhou com as brincadeiras, principalmente com as conversas ( isso que mais machuca ele)
        O sonho do meu esposo, é conversar com o nosso filho.
        Rosangela,o meu esposo ainda não venceu essa dor .
        E o pior,cada dia mais,deixa ele mais triste.
        Eu faço de tudo para não ter que viver com o luto de perder o meu esposo.
        Amo de mais o meu filho, vou sempre lutar por ele.
        Mas só eu sei os desafios que passo.

        • Ola Michelle, obrigado por sua partilha. Quantos anos tem seu menino?
          Esse sentimento da perda do filho idealizado machuca muito, espero que seu esposo consiga superar brevemente essa fase.

  5. A conscientização sobre o autismo deveria também ser uma responsabilidade da mídia, mas parabéns pela iniciativa de compartilhar seu dia-a-dia com quem também busca ajuda!
    Sucesso com o blog!

    • Obrigado Alice pelo comentário. Infelizmente a conscientização na mídia não está acompanhando o aumento dos diagnósticos. Esse Blog é uma tentativa de levar informação confiável a quem mais precisa em um momento delicado e sofrido como o do diagnóstico.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *